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GIRGIS, Sherif; ANDERSON, Ryan T.; GEORGE, Robert P. O que é o casamento: Homem e mulher, uma defesa. 1 ed. Campinas, SP: Vide Editorial, 2024.

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O fio condutor da discussão exposta na obra vem logo em seu título, O que é o casamento? Seria a união entre duas pessoas baseadas apenas no afeto ou podemos entender o casamento como a base fundante de todas as sociedades? De forma racional, nada religiosa, os autores responderão a essas perguntas em seis capítulos, 184 páginas, com linguagem simples e exemplos que facilmente podem ser conferidos no mundo real, de homens e mulheres reais que vivem seu dia a dia em busca da sobrevivência e da educação de sua prole.

Os estudiosos apresentam duas formas de ver a questão: a primeira é chamada revisionista porque critica e molda as políticas conjugais atualmente; a segunda forma é a tradicional matrimonial que molda a legislação e todos os construtos de nossa civilização como arte, literatura, religião e prática social (p. 23). O primeiro capítulo consiste em um desafio, os revisionistas devem elucidar a seguinte questão: que tipo de relacionamento devem quaisquer duas pessoas ter para desfrutar do bem específico chamado casamento?

A partir da questão anterior outras são levantadas, se o casamento for uma questão basicamente de afeto, o que o diferenciaria de uma relação como a da amizade? Deveria o Estado legislar sobre as amizades se são preponderantemente relações de afeto? Se o que diferencia o casamento forem apenas relações sexuais, as relações de cuidado entre pares que se ajudam, muitas vezes até o fim da vida como irmãos, amigos, não deveriam ser reconhecidas pelo Estado e lhes ser concedido o mesmo direito que para pessoas que se relacionam sexualmente?

Digamos que seja apenas uma questão sexual, deveria o Estado reconhecer como casamento relacionamentos poliamorosos? Imagine que haja divórcio entre um “trisal” seria justo um dos homens que não é pai biológico pagar pensão para o filho que não é dele? A criança teria o direito a duas pensões já que possuía dois pais? Reconhecer casamentos fora dos padrões citados traria essas e outras questões para que o Estado resolvesse, por isso mesmo, o casamento possui natureza diferente de qualquer outra relação do âmbito privado.

Digamos que tudo o que foi perguntado seja possível e praticado, podemos chamar essas uniões de qualquer outra coisa menos de casamento, e isso pelas próprias implicações das respostas que elas exigem, assim vemos que não é apenas uma questão de narrativa, se tirarmos as características domésticas, sexuais, exclusividade, seu aspecto heterossexual, estamos falando de qualquer tipo de contrato, menos de casamento (p.50). No segundo capítulo ao falar do casamento como um vínculo integral ficam mais claras as razões pelas quais o que denominamos casamento só pode ser vivido por um homem e uma mulher.

No capítulo citado, a questão biológica da espécie humana é apresentada da seguinte forma, somente a união entre homem e mulher através do coito cumpre o propósito biológico de criar outro ser humano, sendo essa a característica fundamental do que denominamos casamento, mesmo que não haja concepção, nenhuma outra forma de maneira natural é propícia a criar nova vida (p.57). Como ato natural suas consequências não podem ser desprezadas.

Não é apenas a união através do coito que une o casal de forma integral, existe a busca de bens comuns para a vida doméstica com o intuito de criar filhos, pessoas solteiras podem criar filhos, denominamos essas pessoas de mães ou pais solteiros, homem e mulher que se unem com o propósito de gerar e criar filhos, os denominamos de casados e para eles deve haver regras claras sobre a decisão que tomaram. De forma simples, você faz parte de um time ao jogar o jogo, assim também na visão matrimonial, você está integralmente vinculado ao seu cônjuge através do coito e da procriação (p.62).

O casamento como ato traz consequências e permanecer casado significa não estar sozinho em nenhum aspecto da vida, a vivência doméstica exige cooperação em todos os momentos, desde quem faz o café enquanto outro compra o pão até o momento de decidir se as finanças permitem a aquisição de uma nova roupa. Significa também a união entre duas pessoas complementares porque um novo ser só pode vir ao mundo possuindo uma mãe e um pai biológico, nada mais que isso.

 Desta maneira, podemos resumir a primeira parte do capítulo assim: “A visão conjugal define o casamento por um certo tipo de cooperação, definida por certos fins comuns: a união dos corpos e a sua natural realização nos filhos gerados e na vida familiar” (p.69). Se todo tipo de união for entendida como casamento, o bem casamento se extinguirá pelo simples fato de que não pode ser vivido de outra forma.

No capítulo seguinte, O Estado e o casamento, o casamento é visto em sua forma institucional, é discutido os motivos pelos quais em todas as sociedades existem leis que regulamentam a união sexual e produtiva entre homem e mulher denominando-a de casamento (p.76). É atribuído ao ato de casar às funções públicas de cuidado com os próprios filhos e cônjuges. O casamento tem de ser regulado pelo Estado pelo simples fato de estar em jogo direitos, custos e benefícios que interferem no funcionamento da sociedade como um todo, filhos sem pai geram custos à sociedade, como mostram os autores, filhos sem pais têm piores resultados em relação a crianças que vivem em um ambiente familiar seguro (p.82,83).

Os adultos também se beneficiam, como mostrado na página 84 e 85, a situação financeira dos casados é bem melhor, pois propicia que os homens sintam a necessidade de passar mais tempo em casa com sua prole e menos tempo em bares e prisões. Os autores relacionam a influência do Estado na vida privada das famílias à medida que o divórcio e o fracasso no casamento ocorrem, além de se relacionar também com gravidez precoce, pobreza, crime e abuso de drogas (p.87).

No capítulo quatro, os autores mostram como a visão revisionista enfraquece e prejudica as normas sociais de cooperação e exclusividade entre os cônjuges, por consequência, essas mudanças prejudicam o desenvolvimento das crianças, como mostram diversas pesquisas citadas ao longo do texto, a falta de diferenciação nos papeis sociais dentro do lar trazem prejuízos importantes para todas as áreas da vida das crianças, então é preferível que o Estado legisle em favor de que os casamentos se mantenham dentro do que chamam de tradicional, visto que é o ambiente mais favorável para a educação das mesmas.

Nos capítulos cinco e seis, os autores falam sobre igualdade, fazem uma revisão dos possíveis argumentos que podem ser levantados ao verem a visão matrimonial ser privilegiada com relação às leis, mas como mostram, deixar de reconhecer legalmente relações homoafetivas ou poliamorosas como casamento civil não traz nenhum ônus para essas relações, pois outras formas de contrato e reconhecimento podem ser feitas sem que seja necessariamente um casamento com suas implicações sociais, econômicas e afetivas. Caso todas essas relações fossem reconhecidas como casamento outras relações não sexuais também deveriam ser reconhecidas, já que possuem características afetivas tanto quanto as citadas. Deste modo para haver justiça precisamos saber o que é o casamento, suas condições, e só então, estabelecer as diferenças entre esse e as demais relações para que haja equidade legal. A obra encerra com conclusão e apêndice, ambos retomam questões já demonstradas ao longo do texto.

O livro traz questões importantes, no entanto, esperávamos mais da obra, como é escrito por filósofos sentimos falta de exemplos sobre o estado da arte de outros períodos históricos, obras que referenciassem as civilizações anteriores, mostraram pesquisas atuais, porém gostaríamos de mais dados e mais citações porque como se trata de um tema polêmico sempre é melhor fazer mais que menos. Esperamos outras obras e que sejam mais abrangentes que esta inicial. O livro é um ótimo ponto de partida para quem está iniciando os estudos.

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