Pular para o conteúdo principal

Translate

Jesus entre outros deuses: uma defesa da singularidade da fé cristã. Ravi Zacharias. São Paulo: Vida Nova, 2018.

 

Em Jesus entre outros deuses: uma defesa da singularidade da fé cristã, Ravi Zacharias apresenta de forma clara e consistente uma defesa da singularidade da fé cristã; com base nas afirmações de Jesus nos evangelhos, mostra quais diferenças existem entre a cosmovisão islâmica, hinduísta e budista. Nascido na Índia, ao lado de nomes como McDowell e Craig, está entre os maiores apologistas da contemporaneidade. A obra em análise obteve a primeira publicação pela editora Vida Nova em 2018 e possui um total de 272 páginas, divididas em sete capítulos, onde se argumenta sobre a singularidade e a veracidade das afirmações de Jesus sobre si.

Zacharias nos apresenta uma escrita cheia de exemplos da vida cotidiana, pois parte do princípio que a teologia de um indivíduo é revelada muito mais por seu modo de vida que por suas palavras nos discursos religiosos. Por transitar entre o “oriente” e o “ocidente”, logo na introdução temos críticas ferrenhas a respeito da prática de se enaltecer a religiosidade oriental em detrimento da ocidental, fazendo isso sem critérios equivalentes de avaliação. Segundo o autor, “(...) um jornalista pode entrar em uma igreja e zombar de suas idiossincrasias, mas não ousaria fazer o mesmo caso a cerimônia fosse de um grupo oriental.” (ZACHARIAS, 2018, p.11). Isso pode indicar nossa falta de entendimento sobre como a religiosidade de um povo possui importância cultural. Se somos maioria em uma nação, o mínimo seria analisar o fenômeno com o mesmo rigor e respeito que faríamos com qualquer outra religião.

No primeiro capítulo, “Escalando um muro imenso”, vemos como as afirmações de Jesus sobre si desafiam reiteradamente a mentalidade e os ambientes pós-modernos, porque ao dizer-se filho de Deus, pôs a si mesmo como o único caminho para Deus. Além disso, afirmou que Deus, seu pai, é o autor da vida e que o que importa é ir até ele. Desse modo, não deixou brechas para relativismo. Aquele que diz crer em Deus e conhece seu filho por meio de suas afirmações, só possui um caminho; logo, as religiões não levam todas ao mesmo Deus e os conceitos de certo e errado, falso e verdadeiro, voltam às discussões filosóficas. O autor não é um tolo, compreende que em cada religião há uma maneira particular de definir quem Deus é ou não é, mas critica de forma mordaz aos que dizem: “você tem de ser aberto a tudo”, mas na realidade querem dizer: “você tem de estar aberto a tudo aquilo a que eu estou aberto, e qualquer coisa de que eu discorde você tem de discordar”(idem, p.25). Parece-nos que essa postura não só está enraizada no censo comum, como também no entendimento “científico” contemporâneo, é científico o que digo e não posso provar, mas é totalmente senso comum o que o outro diz porque não tem comprovação.

No segundo capítulo, “Rumo a um lar celeste”, o escritor mostra a importância do lugar de origem de alguém para a cultura oriental, por meio das explicações e exemplificações, passagens bíblicas ficam mais contextualizadas para os leitores do século XXI: “No ocidente, em particular na América do Norte, uma apresentação se resume àquilo que eu realizei ou deixei de realizar. As credenciais são individuais, quase como se a pessoa fosse responsável por sua própria origem” (idem, p.50). Diante de tal assertiva, percebemos o impacto que causou quando Jesus reivindicou ser o filho de Deus; por implicação, se Jesus veio de Deus, nas palavras do autor, “Sua jornada terrena não foi um início, mas uma visitação” (idem, p.60), estamos diante de alguém singular, totalmente diferente de todos os que o precederam. Diferente do profeta islâmico, o céu não é um lugar estranho para Jesus, antes é, foi, sua morada, faça isso sentido ou não para um ateu, o que não nos interessa aqui.

“A anatomia da fé e a busca da razão”, terceiro capítulo, Zacharias explica que o problema não era ou é a falta de sinais, o problema consiste nas declarações de Jesus. Os que rejeitam o cristianismo, não o rejeitam por falta de evidências, rejeitam-no pelas afirmações que Cristo fez sobre si mesmo e as implicações que elas trazem. Citando David Hume, sobre a importância de comprovação matemática e experimental, o autor fala da contradição em pensar dessa maneira. Se assim fosse, mais da metade de tudo o que se diz científico não passa por esse crivo. O próprio teste de exatidão não passa, pois como pode ser provada ou experimentada uma afirmação sobre a veracidade do que quer que seja? “A pessoa que exige um sinal e ao mesmo tempo já decidiu que qualquer coisa que não possa ser explicada cientificamente é sem sentido não está apenas querendo manipular o resultado, está perdendo o jogo”. (idem, p.102). Se as palavras de Jesus são relativas e nós formos apenas um amontoado de células “as religiões que procuram manter sagrado o corpo ao mesmo tempo que negam a mão do Criador estão no mesmo barco de céticos que tentam proteger a vida apesar de dizerem que tudo não passa de matéria”. (idem, p.109). Esse é outro aspecto que demonstra a singularidade do cristianismo.

“Uma degustação para a alma” é o quarto capítulo da obra, possui tom mais devocional que avaliativo sobre o tema geral do livro. Nele nos defrontamos com uma apreciação pessoal sobre a postura cristã. O exemplo dado é o do próprio Cristo que não só ensinava, mas tinha uma vida idêntica a sua pregação, aspecto que para muitos cristãos já não existe. Como o próprio autor chama atenção, nossa vivência com aquilo que professamos deve ser mais relevante que nossas palavras.

O quinto capítulo traz um tema polêmico, o título é uma pergunta: “Deus é a fonte do meu sofrimento?”. Este tem sido um dos temas discutidos por ateus e teístas, uma vez que a existência do mal, do sofrimento, parece ser incompatível com a existência de um Deus todo poderoso e todo bondoso. O autor mostra as visões das religiões citadas no início e diz que o cristianismo apresenta: “(...) um contraquestionamento para lembrar ao cético de que (...) se o mal existe, então é necessário pressupor que o bem também existe (...)” (idem, p.166). A frase é simples, porém nos leva à reflexão sobre as leis morais e a nossa racionalidade para diferenciarmos o que pode ser algo mau ou bom. Se o universo for apenas um amontoado de forças cegas, não temos razão para dizer que o quer que exista seja bom ou ruim e, para aqueles que já estão familiarizados com a discussão, sabemos que a questão do contrato social ou cultural não é suficiente para fechar a questão.

Em “Quando Deus ficou calado”, sexto capítulo, análises sobre os momentos de sofrimento em que Cristo permaneceu calado são expostas. Servem à discussão grandes autores como Dostoiévski, C.S.Lewis e são combatidos todo tipo de pressão para que alguém seja convertido ao cristianismo. Zacharias também aponta para a singularidade do cristianismo ao mostrar que Cristo não ensinou uma conversão por meio da violência. Embora ela tenha ocorrido em alguns períodos, a violência não chega a ser intrínseca ao cristianismo como o é para algumas religiões que pregam morte aos “infiéis”.

No último capítulo, “Existe um jardineiro?”, Ravi Zacharias, por meio de uma parábola de Anthony Flew e John Wisdom, argumenta sobre como a mente de um cético pode ser crédula, tanto quanto a de um religioso, pois, nas palavras do autor, como poderíamos explicar cientificamente que o nada absoluto possa produzir processos e resultados inteligentes? O crente pode se apegar à fé e àquilo que pode criar, a palavra de Deus, já o cético, como poderá explicar o fato de existir algo ao invés de nada?

A obra, apesar de curta em páginas, possui uma densidade razoável, referencia muitos autores que podem ser usados como bibliografia complementar. Como crítica construtiva, podemos sugerir uma melhor divisão por assuntos, porque no inicio do livro é falado que serão apresentados a singularidade do cristianismo dentre três religiões, a saber: islamismo, hinduísmo e budismo, mas no decorrer da leitura os assuntos se misturam, e é necessário uma atenção maior para não nos perdemos nas citações de autores e textos, aspecto que, entretanto, não é um fator que desmereça a obra como um todo. Ravi Zacharias é palestrante e fundador do International Ministries; para quem deseja se aprofundar nas discussões apologéticas contemporâneas, a leitura é obrigatória, pois além de revelar uma base teórica consistente, nos instiga à leitura de outros autores.

Quem desejar obter a obra, basta clicar no link da Amazon: https://amzn.to/37i9zqq

 

 

 

Comentários

Seguir

Postagens mais visitadas deste blog

Crente raiz

Sabemos que muitas aflições acompanham os santos nesta caminhada. Não devemos estar apreensivos, nem preocupados, porém isso não deve abrir espaço para adotarmos uma postura irresponsável diante dos acontecimentos. Em “Nas Chamas por Cristo ”, temos relatos de homens e mulheres que não negaram sua fé, não se acovardaram; isso não quer dizer que procuravam um carrasco para ter a chance de provar sua fé, isso apenas quer dizer, que quando eram chamados para testemunhar, não hesitavam, testemunhavam mesmo à custa de suas cabeças. Mais cedo ou mais tarde cada um de nós será chamado para testemunhar sobre a fé, pedirão a razão de nossa fé e o que teremos para testemunhar? Temos dificuldade de nos mantermos crentes porque não podemos estar nos cultos, que tipo de evangelho é esse que professamos? Muitos de nós não conseguimos orar sozinhos e achamos que demonstramos fé ao nos reunirmos em montões nas igrejas aos domingos. Será que nós como igreja, estamos preparados para o princípio da...